terça-feira, 30 de julho de 2013

Los amiguitos del Papa





Juntaram-se três milhões de pessoas, de inúmeros países, na praia de Copacabana, para ver, ouvir e celebrar o Papa Francisco. Nem réveillon, Carnaval, Gay Parade ou um show de Roberto Carlos, alguma vez congregaram tanta gente. Sendo ateu e acreditando que as religiões foram e são, muitas vezes, instrumentos de controlo do indivíduo e providenciadoras de sofrimento e intolerância, seria muito fácil e, no entanto, limitado, queixar-me dos inconvenientes que esta visita papal causou na vida dos cariocas, do dinheiro gasto pelos cofres públicos, da atabalhoada organização ou dos maluquinhos da fé que se atiravam para cima da carro do Papa como se quisessem tocar no santo sudário a troco de um braço partido.

Ou então, apesar das minhas reservas papistas, poderia embarcar na onda unânime que acena com a cabeça e diz: "Este Papa é o máximo". Reconheço que este Papa está mais próximo daquilo que eu admiro na doutrina cristã e mais longe daquilo que representa o polvo da Cúria, também conhecida como a borucracia que se aproveita sagazmente da relação entre o homem e deus.

O Papa é fixe, bacano, sensato, sem manias, é verdade. Mas preferi olhar para esta semana - ou pelo menos tentei - com os olhos de um aborígene, de alguém distante, que não tivesse estudado num colégio católico ou uma avó que rezava o terço ou uma estatueta barbuda, em casa do pais, que durante toda a infäncia serviu de modelo miniatura para o que seria a grandeza do Senhor.

O que quero dizer: se um católico fosse testemunha de uma mega celebração da Cientologia ou do Xintoismo, possivelmente analisaria os rituais e as crenças com desconfiança ou, pelo menos, com um estado mental prático e lógico que normalmente não usa para analisar a sua própria religião.

Ou seja, é tão válido um católico não acreditar, como os cientologistas, que os nossos corpos estão possuídos por almas de extra-terrestres, como um xintoista não acreditar na história de um deus que envia o seu filho para a Terra, numa missão suicida. Filho esse que nasceu de uma virgem, foi concebido pelo Espírito Santo e que regressa depois de morto como um super herói.


Olhando para o que se passou no Rio de Janeiro durante a visita do Papa com os tais olhos do aborígene, ou do xintoista, parece muito estranho ver tantas pessoas emocionadas com algo que pode ser mentira, ou pensar que uma história improvável, desenvolvida, propagada e usada para criar um império nos últimos dois milénios, consegue mover tantos seres humanos, dinheiro, logística, horas de TV.

Se for consequente com o meu ateísmo, confesso que me espanta ver três milhões de pessoas a celebrar algo que será apenas uma invenção. Se deus não existe, se Cristo, em vez de divino, foi apenas um homem, um contrário, um líder da oposição, um guerrilheiro da paz, ver três milhões de pessoas alegremente desenganadas é uma peripécia extraordinária, uma Guerra dos Mundos 2.0.

No entanto, este ateu reconhece que a cidade ganhou, por esses dias, uma paz inusitada, mais decência e alegria limpa - com excepção dos habitantes de Copacabana que tiveram de ouvir jovens mexicanos cantar músicas de Cristo versão mariachi.

Continuo a perguntar se, para ser uma pessoa melhor e ter o outro em cuidado, o homem precisa de fé em deus e na sua cartilha moral, se precisa de uma organização global, com líderes e seguidores, se precisa da promessa de viver além desta vida. Não sei, esperava que não, mas vejo que tem sido sempre assim. Uma coisa é certa - e estas Jornadas da Juventude provaram isso -, para sermos pessoas melhores, precisamos de não estar sós, de fazer parte, de ter quem nos cuide e a quem cuidemos, de uma causa comum.

Se for o amor, melhor.


Ps - como se pode ver pelo traje na foto, o Papa é do Vasco da Gama.





  

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