segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Mariza no Rio de Janeiro




1)

Apesar do comportamento afetivo e caloroso do público no concerto da Mariza, no Rio de Janeiro, a falta de respeito por quem canta e toca foi evidente. Celulares apitando amiúde, gente a tirar fotos insistentemente, com flash, no meio das músicas, pessoas tagarelando durante o show e outras chegando atrasadas, levantando-se a meio, entrando e saindo. Quando Mariza pousou o microfone para, como nas casas de fado, cantar sem amplificadores numa sala gigante, uma senhora na minha fila disse à a filha: "Uê, cadê o microfone?" E quando alguém pediu que a senhora se calasse porque estava a perturbar a interpretação da fadista (a sacana da velha passara o show inteiro a trocar impressões desnecessárias com a filha), a velha respondeu ao pedido de silêncio:

- Sua palhaça, o que você sabe do Fado?

A velha, pelos vistos, é que não sabia nada do fado, ou sabia tão pouco que desconhecia o refrão: "Silêncio que se vai cantar o fado", tantas vezes anunciado ao público antes de um fadista começar a sua atuação.

Talvez porque estávamos na Casa das Artes, na Barra, entalados entre lojas de franquia e shoppings colossais, a senhora pensasse que se encontrava na praça de alimentação do Barra Shopping.

Depois, quando Mariza decidiu cantar um fado entre a plateia, a loucura dos celulares ultrapassou a linha da decência, com pessoas colando os aparelhos quase na cara da fadista e com uma mulher tentando (por três vezes) pedir um autógrafo a meio de um fado.

Por mais que ame o fado - e até que o ache meu - não considero que exija mais respeito do que um concerto de trash metal. Nem acredito que o fenómeno da má educação dos celulares, atrasos e conversetas durante o espectáculo, sejam características exclusivas do público carioca - infelizmente, a obsessão em registar fotograficamente um evento no qual se participa, em vez de o desfrutar, é global e dissemina-se com a velocidade da estupidez em banda larga.


2)

Mariza não é a minha fadista preferida. Mas isso não interessa nada. As suas qualidades interpretativas, tanto vocais como cénicas, são as mesmas das grandes divas. Os seus músicos são altamente virtuosos. Ela é enorme em palco. E aquilo que fez alvoroçar, dentro de nós, ao cantar Primavera e Barco Negro, compensa qualquer má educação de algum público na plateia; aquilo que ela que consegue - voz, voltas, corpo dançante, peito lusitano, cordas tinindo nas guitarras - é muito mais do que um estilo musical de uma cidade, a minha cidade. É a minha vida inteira e a vida daqueles que me antecederam, é a nossa vida pulsando como se fosse um coração fora do peito.

3)

Silêncio, que se vai cantar o fado:




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