segunda-feira, 8 de abril de 2013

Porrada

O trânsito no Rio é outra forma de violência, menos chocante do que a violência do tráfico, porque, de certa maneira, todos fazem parte dela. Não é uma violência com o rosto do neguinho traficante ou do moleque que dispara um 38 no turista. Está no pedestre, no ciclista, no morotista de carro, van, ônibus e táxi. Está no desconforto e agressividade de trens sobrelotados e no castigo sobre pessoas que já têm vidas fodidas e que ainda demoram duas horas para chegar ao emprego, espremidas, dormindo em pé,  conduzidas por lunáticos. Do xingamento, à manobra perigosa, do bêbedo ao volante ao pedestre que se atira para o meio da rua, e entre atropelamentos (principal causa de morte no trânsito na cidade), despistes, selvajaria , hoje, o trânsito machuca e amachuca o Rio e quem aqui vive. É impossível que ele não contamine o nosso dia, que não nos ponha em risco ou na linha de tiro de um insulto. Mas, tal como a ausência de Estado nas favelas durante décadas, a ausência de civismo e precaução com o outro no trânsito parecem ser algo com que convivemos sem grande indignação. E se a informalidade pode ser um atributo deste lugar lindo, se o deboche perante a lei tem alguma graça num certo jeito de ser carioca, a verdade é que milhões de pessoas sentem-se agredidas todos os dias, têm vidas piores, vertem raiva, frustração, insultam, andam à porrada, passam vermelhos. A mobilidade não é apenas conseguir levar milhares de pessoas daqui para ali. E se dizer que a violência do trânsito mata muito não chega, se as campanhas de sensabilização caem em saco roto, talvez multas mais severas (funcionou em Portugal e Espanha), com altos valores pecuniários, façam as bestas ponderar antes de pisar na tábua ao ver um semáforo laranja a cem metros. Se em em vez da TV plasma, o dinheiro for para pagar a multa, se em vez de cagar para o bafómetro, os bêbedos que causam acidentes tiverem de cumprir penas de prisão e serviço comunitário em hospitais (porque não lixeiras?), talvez se consiga diminuir o grau de selvajaria e boçalidade no trânsito carioca.  Até lá, é mesmo uma selva lá fora.

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